Não há dúvidas de que o esporte é uma ferramenta de grande impacto na vida do ser humano. Além dos benefícios físicos proporcionados, a prática esportiva é positiva para a saúde mental, a prevenção de doenças, o desenvolvimento social, assim como a inclusão de pessoas com deficiência na sociedade. Nessa semana, conversamos com o paratleta Vagner Andrade, bodyboarder local de Ilha Comprida, para conhecer mais sobre a sua história e sobre como o esporte transformou sua vida.
Como e quando você conheceu o bodyboarding?
Eu conheci o bodyboarding na escola, na década de 90. Eu estudava com dois amigos que pegavam onda de bodyboarding, o Adilson Teixeira e o Gilson Lima. Eles comentavam muito sobre esse esporte e aquilo me contagiava, me motivava mais para saber o que era o bodyboarding. Assim comecei com uma prancha emprestada dos irmãos Glauco e Leandro Rigo, que trouxeram o surfe para cá onde eu moro e a partir daí não parei mais.
Pode nos contar sobre a sua deficiência?
A minha deficiência física é uma luxação congênita no quadril, onde a minha perna esquerda é mais curta. Tenho uma luxação no ombro direito causada por problemas no parto. Naquela época, os médicos disseram que aos 12 anos provavelmente os meus movimentos ficariam comprometidos e eu poderia ter que utilizar cadeira de rodas para me locomover. Graças a Deus por eu ser uma pessoa ativa, por sempre gostar de me movimentar, isso não aconteceu. Uma coisa que sempre me motivou foi os meus pais me dizerem que eu comecei andar somente após os quatro anos de idade, isso sempre me motivou a romper paradigmas e me tornar uma pessoa independente.
E de onde surgiu a ideia em se tornar um paratleta de bodyboarding? Alguém te incentivou?
A ideia de me tornar um paratleta surgiu meio que por acaso de uma roda de conversa. Um conhecido estava me elogiando e disse que o surf estava se tornando olímpico, então eu teria grandes chances de participar de eventos dessa magnitude. A partir daí fiquei pensando sobre isso, comecei a pesquisar e mandar e-mail para a Federação Paulista de Bodyboard, Confederação Olímpica… desde então assumi essa postura de paratleta de bodyboarding. Atualmente tenho o apoio do presidente da Liga Nacional de Bodyboarding (Marcello Pedro), do treinador da Seleção Paralímpica de Atletismo (Hudson). Estamos buscando dentro das diretrizes a possibilidade que o esporte seja avaliado e incluído. É um sonho a ser realizado. E eu também conto com o apoio da Kpaloa que me fornece uma nadadeira que considero como a extensão do meu corpo. Com as nadadeiras Kpaloa consigo mais agilidade na remada porque utilizo muito as pernas, além da propulsão e a explosão que me ajudam a executar as manobras com fluidez.
E você já chegou a competir em eventos?
Já competi regionalmente com pessoas não-deficientes. Tenho três títulos municipais: 1998, 2000 e 2007. Eu competi no circuito estadual nos anos 2003 e 2004, nesse último fiquei entre os top 20 profissionais mesmo sendo amador e não participando de todas as etapas devido compromisso no trabalho, fator distância e a falta de incentivo. Em 2006 tive a honra de participar de um evento mundial que foi o Katherine Melo em Itajaí, onde estavam os melhores bodyboarders do mundo e tive a honra de ser um deles. Em 2014 participei do Rio Masters e em 2018 do Bodyboard Legends, os dois eventos no estado do Rio de Janeiro, que por sinal fui bem recebido e aprendi muito com as lendas do bodyboarding.
Como é a cultura do bodyboarding onde você mora? Em Ilha Comprida existem projetos voltados para essa modalidade?
A cultura do bodyboarding aqui em Ilha Comprida está sendo trabalhada para resgatarmos as pessoas que já tiveram contato com a modalidade e também as crianças. Tudo para que possam ser pessoas melhores por meio da prática desse esporte maravilhoso. Tenho orgulho de ser o ícone do esporte aqui em Ilha Comprida. Vejo que a minha perseverança e força de vontade tornaram-se uma motivação tanto para a galera que está voltando para o bodyboarding como para a garotada da nova geração.
Qual a importância de projetos sociais principalmente para as pessoas com deficiência?
Os projetos sociais são fundamentais para a cultura de todas as pessoas, pois estimulam o respeito mútuo, um bom comportamento frente a natureza que, por sinal, não é apenas o nosso playground, mas também nosso meio de sustento e de onde vem boa parte dos alimentos. E os projetos sociais exclusivos para pessoas com deficiência são de suma importância, pois através do esporte podemos vislumbrar perspectivas diferentes de se viver de forma prazerosa e mais independente.
O que o esporte representa na sua vida? Aliás, como era a sua vida antes do Bodyboarding e como ela ficou depois?
O bodyboarding para mim é como uma religião, um estilo de vida, uma terapia. Sem ele provavelmente teria escolhido caminhos e opções não tão legais. Fora os benefícios que ganhei… depois que entrei para o esporte, não tive mais crises de bronquite, os meus movimentos também melhoraram consideravelmente. Em resumo, o bodyboarding me fez conhecer pessoas, lugares, culturas e idiomas que fizeram com que eu me tornasse uma pessoa melhor.
Deixe uma mensagem para as pessoas que estão lendo essa entrevista, para que possam se sentir inspiradas a superarem seus próprios limites.
A mensagem que deixo é que todos deveriam conhecer esse esporte que nos traz sensações incríveis, que só quem experimentar vai entender o que estou dizendo. É uma sensação de liberdade, de conquista, interação com o oceano… Através do bodyboarding conseguimos aprender valores e aplicá-los em nossas vidas, como o respeito e a humildade e com ele podemos romper paradigmas.
Entrevista realizada por Parada Letícia